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Hangman’s Noose, por Acad. Luiz Celso Mattosinho França

01.02.2010 | Tertúlias

Formado há pouco tempo, fui para os Estados Unidos, na Flórida, completar minha formação como patologista em 1957. Carregava já alguma experiência profissional em autopsias, obtida no Departamento de Anatomia Patológica da USP e no Serviço de Medicina Legal da Polícia. Assim é que, lendo o artigo de Arnaldo Amado Ferreira sobre o enforcamento de Cláudio Manuel da Costa, publicado agora por seu filho, meu contemporâneo de faculdade, rememorei os conhecimentos sobre a morte por enforcamento que eu possuía então, segundo a doutrina ensinada na Medicina Legal brasileira. Como choque cultural médico, entrei em contato com os conhecimentos sobre enforcamento vigentes no sul dos Estados Unidos, que me foram ensinados por um patologista mais velho, Joe Dyrenforth. Este tinha sido legis- ta de uma penitenciária de negros, no tempo da segregação, que, aliás, ainda perdurava em 1957, quando comecei meu estágio. Nessa penitenciária seguia-se a norma do “escreveu, não leu, a forca comeu”.

O enforcamento punitivo, judicial, não consta de nossa tradição penal, como ocorre no país do Norte, com raízes anglo-saxônicas, vikings e normandas. Na nossa gênese, os romanos, visigodos, suevos e muçulmanos não nos trans- mitiram a tradição do enforcamento; nessa circunstância, usavam, antes, o estrangulamento com corda e nó corrediço, com ação direta sobre a laringe e o hioide — elevação da base da língua —, que consistia na compressão de vasos cervicais, ramos nervosos e do corpo carotídeo, confor- me a doutrina ensinada por nossa Medicina Legal. Já o enforcamento anglo-saxão é mais complexo, dado o uso do hangman’s noose, o nó do enfor- cador, no qual o nó corrediço é baseado no enrodilhamento da corda, que forma peça rígida, de um palmo de comprimento, comprimindo lateralmente o pescoço, além de estrangular.

O nó do enforcador, sempre colocado atrás da orelha esquerda, ao ser tensionado pelo peso do corpo, causa a chamada hangman’s fracture, a fratura do enforcador, afetando as vértebras cervicais iniciais e seus processos transversos, lesando ou transeccionando a medula espinhal. A liberação desta desencadeia a dança do enforcado e a ejaculação final, razão da ignomínia da morte pelo enforcamento anglo-saxão. Os enforcamentos dos condenados de Nuremberg, e mais recentemente de Saddam Hussein, foram todos executados com o hangman’s noose. Já com o irmão de Saddam, dias após, houve a intercorrência da decapitação pela corda, que ocorre quando o corpo é pesado ou tracionado pelos auxiliares do carrasco. O mecanismo é em todo semelhante ao que nossas avós usavam para matar frangos, com a compressão da articulação atlanto-occipital, que, deslocada, desencadeia o debater e morte do destron- cado. O enforcamento com o uso do nó do enforcador é parte da cultura popular americana, e a exibição de amostras desse nó era parte das manifestações da Klu Klux Klan, dos linchamentos, bem como uma forma de ultrajar os negros em profissões acadêmicas.