Contemporâneo: Longevidade
Graças ao desenvolvimento espetacular do mundo, em todos os campos, a longevidade no Brasil está crescendo. Fora de 43 anos em 1940, sendo de 74,4 anos em 2014, mas foi de 83,91 no Japão e de 89,68 em Mônaco, a campeã. Precisa crescer mais. Muito se fala dos motivos dessa longevidade estar crescendo tanto. Um deles seria a cura de várias enfermidades. Porém, antigamente, comia-se melhor, tinha-se muito mais atividade física e menos obesidade. Oswaldo Cruz e outros haviam erradicado o Aedes aegypti no início do século XX e não havia febre amarela, dengue, zika e chikungunya. Penso que a grande causa foi a descoberta dos hipotensores.
Desde 1904, Ambard e Beaujard demonstraram que o sal é a principal causa da hipertensão arterial e que dietas pobres em sal deveriam ser utilizadas no tratamento da hipertensão. Existem os hipotensos essenciais, pessoas que normalmente têm pressão arterial muito baixa, até idade avançada, assintomática, e aqueles que, com a idade, ficam hipertensos – os hipertensos essenciais –, que também nos primeiros anos de doença são assintomáticos. Os hipotensos são resistentes ao sal; podem ingerir comida salgada e sua pressão não se eleva. Coube ao professor inglês H. E. de Wardener, durante o VIII Congresso Internacional de Nefrologia, em Atenas, na Grécia, em 1981, explicar o motivo do sódio gerar pressão alta, debaixo de uma salva de palmas de toda plateia, em pé. Os pacientes sensíveis ao sal, que são a maior parte da população, quando ingerem comida salgada, ou seja, com sódio, lentamente vão ficando com excesso de sódio no corpo. Nesse momento o sódio começa a tentar penetrar nos tecidos e nos vasos, mas, os mecanismos de defesa vascular, através de cotransportadores 2NaCa, tentam impedir essa entrada, trocando o sódio pelo cálcio. Quando cálcio entra na parede muscular dos vasos, como um vasoconstrictor que é, aumenta a resistência vascular periférica produzindo vasoconstrição, ou seja, hipertensão arterial. Por esse motivo os bloqueadores de canais de cálcio são hipotensores.
Quando medimos a pressão arterial temos dois números. O primeiro é a pressão sistólica. Ela reflete a força do ventrículo esquerdo para mandar o sangue ao organismo, através dos vasos, e, o segundo, a pressão diastólica, que reflete a resistência vascular periférica, ou seja, a verdadeira pressão arterial. À medida que envelhecemos, a aorta e os grandes vasos vão ficando esclerosados, e o coração precisa fazer mais força para enviar o sangue para o corpo, provocando o que denominamos hipertensão sistólica. Quando há um aumento da pressão sistólica, em desacordo com o nível da pressão diastólica, chamamos hipertensão arterial sistólica isolada ou dominante, que reflete o mau estado dos grandes vasos.
deraram estar dentro dos limites 90/60 e 120/80 mmHg, após estudarem 11.383 indivíduos. Porém muitos duvidaram; criaram de forma empírica o número 140/90 mmHg como a divisória entre hipertensão e normotensão e conseguiram que a Organização Mundial de Saúde aprovasse esses números em 1958. Em 1977 vários médicos, especialistas em tratar hipertensão arterial, criaram o que denominariam de primeiro Joint. Após houve outros até o 7o Joint, em 2003, que pensaram que seria o último. Nessa reunião a pressão ideal deveria ser até 115/75 mmHg., embora não dessem muito relevo a esse número. O pior é que poucos médicos, que ainda não acreditavam que o controle rigoroso da pressão arterial é importante para a longevidade sadia, criaram, em 2014, o que chamaram de 8o Joint, contra essas ideias e, em 2017, nossos jornais divulgaram uma campanha para o tratamento da hipertensão arterial, defendendo ainda o número 140/90 mmHg, como o valor limite.
Tratando portadores de doença renal crônica avançada, pré-dialítica, constatamos que a hipertensão arterial era a maior vilã entre suas causas, pois todas elas: nefropatia diabética, glomerulopatias, rins policísticos e outras, cursavam com hipertensão arterial e, se tratássemos rigorosamente a hipertensão desses doentes, mantendo-a sempre que possível até 115/75 mmHg, transformando-os em hipotensos essenciais, sua nefropatia estacionava ou regredia, principalmente se a causa dessa enfermidade fosse a hipertensão arterial. Antes da descoberta dos hipotensores, a partir de 1947, somente os hipotensos essenciais viviam mais de 90 anos, hoje temos até obesos mórbidos vivendo mais de 90 anos e lúcidos, desde que normotensos.
Para tratarmos a hipertensão temos de usar no mínimo duas medidas. Primeira – Usar um diurético tiazídico para não precisarmos abolir o sal da dieta. Eles eliminam o sal que ingerimos pela urina. Os dois que uso são: a hidroclorotiazida, que o governo distribui pelos seus postos e pelas farmácias populares, e a clortalidona. A hidroclorotiazida age por 6 a 8 horas. Se for administrada pela manhã não age no sal do jantar e da ceia noturna. É preciso usá-las duas vezes ao dia; já a clortalidona age por até 48 horas. Em doses menores, uma vez ao dia, tem efeito protetor maior. Segunda – Usar sempre um bloqueador da angiotensina 2. Temos dois: os terminados em pril: captopril, enalapril, ramipril, etc., e os terminados em sartana: losartana, valsartana, candesartana, etc. Parece que os primeiros são mais potentes, mas podem produzir tosse, e os segundos geralmente assintomáticos.
Por que não devemos comer totalmente sem sal? O sódio é muito importante para os animais. Quando os índios ianomâmis foram estudados em 1975, no norte do Brasil, na divisa com a Venezuela, por Oliver e cols., verificaram que, por eles comerem totalmente sem sal, excretavam menos de 1 mEq/dia de sódio e nenhum era hipertenso, nem tinham doenças decorrentes da hipertensão arterial, porém morriam cedo, em redor de 70 anos de idade. Por quê? As dosagens de renina e de aldosterona, estavam em níveis altíssimos. A angiotensina 2 não fora dosada, porque seu método de dosagem não estava disponível, mas deveria estar também muito alta, provocando ateroarteriosclerose generalizada e morte prematura.
Como a hipertensão arterial destrói nosso sistema vascular provocando mortes prematuras e evitáveis? Conhecemos dois mecanismos. Toda vez que nossa pressão arterial fica acima de um dado número, que defendemos ser de 115/75 mmHg, vários “veneninhos”, denominados citocinas pró-inflamatórias são ativados, comandados no caso da hipertensão pelo fator de crescimento transformador-beta (TGF-β). No diabetes ocorre fenômeno idêntico toda vez que a glicemia fica maior de 126 mg/dL, só que desta vez, a citocina chefe é o fator nuclear-kappaB (NF-ķB). Essas citocinas diferentes provocam doenças renais crônicas diferentes. A da hipertensão tem pouca ou nenhuma anemia e se acompanha de pouca proteinúria ou síndrome nefrítica; e a do diabetes com anemia precoce e intensa e síndrome nefrótica. O segundo mecanismo decorre de níveis da pressão arterial, enviados pelo coração, para a aorta e seus ramos. Essa pressão sanguínea, quando elevada, pode produzir leves lacerações nos vasos, como coronárias, carótidas e aorta. O organismo corrige essas lesões com colesterol, produzindo as famosas placas de ateroma, principais responsáveis pelo infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral. Os hipotensos genéticos ou fabricados por hipotensores raramente têm esse modo de morrer.
Os hipotensos vivem mais, com melhor qualidade de vida: sem hipertensão sistólica isolada ou dominante; sem proteinúria, sem infarto do miocárdio, com menor perda da lucidez e sem perigo de apoplexia.