PortugueseEnglishSpanish
Notícias

Carmen Escobar Pires

20.02.2017 | Acadêmicos, Gerais

PRIMEIRA MULHER A PRESIDIR UMA ENTIDADE MÉDICA NO BRASIL!1

Helio Begliomini

Carmen Escobar Pires nasceu aos 9 de setembro de 1898, na cidade de Santa Rita do Passa Quatro (SP). Era filha de Manoel Bueno Barbosa Pires e de Teresa Escobar Pires.1 

Formou-se professora normalista em 1914 e graduou-se, em 1920, na terceira turma da Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, hoje, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, ocasião em que defendeu a tese Semiótica dos Pleurises. 

Foi a terceira mulher do Estado de São Paulo a se formar em medicina, sendo precedida por Délia Ferraz e Odette N. de Azevedo Antunes, graduadas em 1918, na primeira turma da Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo. 

Interessada por maiores conhecimentos, empreendeu viagem de estudos à Europa, aprimorando-se em Paris. Especializou-se em cirurgia obstétrica. 

Retornando ao Brasil, dedicou-se também à carreira universitária, como professora de Medicina, ao longo de sua vivência profissional. Teve grande atuação científica. Não se encontravam textos de mulheres médicas na revista Gazeta Médica da Bahia até 1927, quando Carmen Escobar Pires publicou o artigo intitulado “Sobre um Caso de Síncope Anestésica — Injeção Intracardíaca de Adrenalina — Cura”. 

Outrossim, são de sua lavra as monografias: Contribuição ao tratamento dos acidentes da gravidez tubária (1928, 31 páginas); Corioepitelioma primitivo da trompa (1938, 16 páginas) e Tumor hipernefroide do ovário (1951, 16 páginas em coautoria com Altino Antunes e Carlos Ribeiro Macedo); assim como os artigos “Arrenoblastoma do ovário” (1938); “Arrenoblastoma: evolução de um caso durante 12 anos: refeminização e posteriormente gravidez e parto normais” (1944); e “Estroma do ovário” (1945). 

Carmen Escobar Pires era membro do Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Ingressou, aos 29 anos (!) e com apenas oito anos de exercício profissional, como membro titular da Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, hoje, Academia de Medicina de São Paulo, em 1º de junho de 1928, permanecendo nesse sodalício por 55 anos (!). Teve a honra de ser, aos 53 anos e após 23 anos de pertença a essa entidade, a primeira mulher presidente, sendo precedida nessa função por 48 expoentes da medicina paulista. Exerceu seu mandato durante um período anual entre 1951-1952. O mandato presidencial de um ano foi estabelecido desde a fundação da entidade, em 7 de março de 1895, persistindo durante 72 (!) anos até 1967, quando passou a ser bienal. 

Em agosto de 1965, Carmen Escobar Pires ocupou o cargo de assistente-adjunto do então criado Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Associação Evangélica Beneficente. Nessa entidade, prestou serviços médicos por mais de 30 anos! Era presbiteriana e participou intensamente da vida de sua igreja, tendo sido diaconisa da Primeira Igreja Presbiteriana Independente, em São Paulo. 

Carmen Escobar Pires não se casou, tampouco deixou descendentes. Faleceu em 10 de fevereiro de 1984, aos 85 anos. Seu corpo foi sepultado no Cemitério dos Protestantes, fundado em 1858 e localizado na Rua Sergipe, n. 177, no bairro de Higienópolis. Seu nome é honrado como patronesse da cadeira n. 112 da augusta Academia de Medicina de São Paulo. 

Existem no cenário brasileiro apenas três outras entidades médicas mais vetustas que a Academia de Medicina de São Paulo — fundada em 7 de março de 1895 — que jamais tiveram mulheres como presidentes, ou, se tiveram, foram bem posteriores ao mandato de Carmen Escobar Pires (1951-1952): 1. Academia Nacional de Medicina, fundada em 30 de junho de 1829, jamais teve uma mulher como presidente; 2. Associação Médica de Pernambuco, fundada em 4 de abril de 1841, teve as seguintes mulheres na presidência: Darcy Gonçalves de Freitas (1985-1987), Jane Maria Cordeiro Lemos (2003-2011), Silvia da Costa Carvalho Rodrigues (2011-2014) e Helena Maria Carneiro Leão (2014-2017); e 3. Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, fundada em 14 de fevereiro de 1886, teve como única mulher na presidência Marilia de Abreu Silva (2011-2014 e 2014-2017). 

Esses dados, associados ao fato de que em meados do século XX havia um número exíguo de mulheres médicas, além de um explícito preconceito ou uma dissimulada misoginia com relação à ascendência feminina e a valoração da masculina, facultam, pois, a inferir não somente o elevado grau de conhecimentos técnico-profissionais, mas também o grande respeito e a inegável capacidade de liderança que Carmen Escobar Pires tinha entre seus pares para galgar a presidência da honorável Academia de Medicina de São Paulo, numa época totalmente infensa a essa façanha!

Carmen Escobar Pires, a única mulher que se graduou na terceira turma
da Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, em 1920,
e a terceira mulher formada em Medicina no Estado de São Paulo.

Helio Begliomini
Membro da Associação Paulista de Medicina,
Academia de Medicina de São Paulo, Academia Cristã
de Letras, Academia Brasileira de Médicos Escritores e
Sociedade Brasileira de Médicos Escritores