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Humanismo da medicina posto em xeque

13.06.2016 | Acadêmicos, Gerais

Welcome technicism! …

Arary da Cruz Tiriba
João Paulo Botelho Vieira Filho

Temporada de ENEM, de vestibulares… Mocidade em ebulição! 

Profissões… quaisquer que venham a ser almejadas, serão validadas pelo empenho, dedicação e arte nelas aplicadas, o que leva à apreciação tanto da obra realizada quanto do executante, atuações e efeitos em que todas têm igual mérito. 

A exemplaridade da conduta profissional e da assistência à comunidade na área da saúde estão aquém do que se consideraria razoável, haja vista as reclamações pela demora no atendimento do sofredor, o excesso de exames subsidiários solicitados e a pressa à ausculta do queixoso, vícios diariamente expostos pela mídia, o que não abala a aspiração para introdução à classe talvez porque o idealismo do jovem anteveja a reparação em que viria a figurar como ator imaculável, ainda que consciente, das imagens do médico, reproduzidas ora como anjo, ora como deus, ora como demônio… Será?! 

Ainda assim, ano após ano — Medicina — pertinaz alvo da juventude! 

Conotação, do avental branco, a dotação da efusão humanística, interpretada, “grosso modo”, como a interação com o paciente e seus familiares, somada à consideração de interferências socioambientais e à oferta do conforto moral. 

Aí, a advertência para situações incomuns que abalam os agentes. 

AA. — meio século de atividade na Profissão e no Ensino — comentam o caso trazido a ambos pelos Internos e Residentes, para a DISCUSSÃO CLÍNICA do dia. 

N.N.N., 18 a., fem., internada à véspera, portadora de HIV, tuberculose peritoneal (biópsia de linfonodo positiva), mais herpes-zóster (popularmente cobrelo) torácico. HIV adquirido via gestacional materna, transmissão vertical; mãe suicidara-se à frente da moça, ateando fogo em si própria. Pai presidiário (tráfego de drogas), também com tuberculose; a jovem o visita com regularidade. 

Carga viral elevada, tratamento sofrera descontinuidade, necessitando retomada. 

Paciente e namorado têm acertado casamento; parceiro, consciente dos males da associada, teria assegurado que manterá continuidade das relações sexuais sem camisinha e sem temor por tal comportamento. 

Retro/Prospectiva ao primeiro momento. 

Diagnóstico, no Hospital de Ensino, frequentemente, rapidíssimo, particularidade de Universidade bem edificada; não raro, do Pronto Socorro à admissão na enfermaria, já definida a doença principal! Welcome technicism! 

Diagnósticos extremamente rápidos! … Adequado? Ou precipitado? Para o aprendizado do Interno e/ou Residente? Onde fica? … A consideração do diagnóstico diferencial?! … A reconstituição da história natural da doença?! … A fonte suposta? O(s) elo(s) da infecção?! … Redução, apenas, à definição nosológica e à terapêutica?! … 

Noivo, a par da situação da jovem, ainda assim, disposto ao matrimônio? Deverá ser advertido? 

Bagagem da cultura e experiência, do médico, bastante para a tomada de medidas aconselháveis da futurologia vital do casal, da eventual prole? 

Coincidentemente, ao momento da Discussão no corredor da Enfermaria, o Sacerdote Franciscano, capelão do Hospital — jovem, etnia japonesa —, pede licença para cruzar o grupo dos dois Professores e alunos e, assim, levar conforto espiritual a paciente de outra enfermaria. O que induz a apreciar… 

Um Religioso, qualquer o Credo de Fé, estaria preparado para ouvir e aconselhar aqueles jovens que se amam? 

Moça, instrução fundamental; traços ainda atraentes, nada deslumbrantes. Herdou da mãe a doença. E a tuberculose? Fonte paterna? Persistência das visitas na prisão… Qualidade de ligação paterno/filial? Admirável? Execrável? [se malformada — destrutiva — a família]. O que requer o máximo de habilidade, no interrogatório ativo, visando ao esclarecimento sobre comportamento social em tal unidade(?) do lar, complementado pelo requisitório da certeza — confidenciosa — que nivela Médico & Sacerdote… Medicina & Sacerdócio… 

À cena existencial de um casal de jovens — mesmo se alheios ao ENEM, ao vestibular, à concórdia social… bastante? Nosso julgamento instantâneo? Requisitaríamos aquele consultor consumado? [Prof. Flamínio Fávero, no píncaro celestial a que fez jus, há muito inacessível]. Psicólogo? … Obstetra? … Hebiatra? … Papa Francisco? … 

Jovens aspirantes à carreira — Medicina — não fazem ideia do que os aguarda, da complexidade do humanismo, da sua sobreposição ao imprevisível.

Arary da Cruz Tiriba 

João Paulo Botelho Vieira Filho 

Professores Universitários da UNIFESP/EPM