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Acadêmico Domingo Marcolino Braile foi entrevistado pelo jornal doCREMESP

05.12.2016 | Gerais

EU, MÉDICO
Domingo Braile

O inventor de biopróteses que substituem válvulas cardíacas
“A cirurgia cardiovascular vem passando por transformações para tornar-se menos invasiva e cada vez mais fisiológica”

Um dos mais renomados cirurgiões cardiovasculares do País – mundialmente premiado e reconhecido por suas inúmeras contribuições para o avanço das técnicas cirúrgicas, que, segundo sua definição, “englobam ciência e arte” –, Domingo Marcolino Braile vem de uma família de médicos de origem italiana, e é detentor de uma das mais brilhantes carreiras na especialidade. 

“Buscando dispor de um substituto para as válvulas cardíacas doentes, comecei a estudar o pericárdio bovino para a confecção de biopróteses, em 1973. Quatro anos depois, elas passaram a fazer parte do arsenal cirúrgico disponível a todos os cirurgiões cardiovasculares”, conta. 

Ao longo de 60 anos de atividade na área, Braile desenvolveu e adaptou muitas técnicas, entre elas: soluções e equipamentos para proteção miocárdica durante as operações; procedimentos para reconstrução de aneurismas do ventrículo esquerdo; estratégias para plástica da válvula mitral e tricúspide; desenvolvimento de equipamentos nacionais que transformaram o Brasil de importador a exportador de insumos para as cirurgias cardíacas, cumprindo um desejo do Prof. Euryclides Zerbini. “Não fui o único, mas isso possibilitou que nosso País detivesse uma das mais avançadas coberturas nesta desafiante área do conhecimento”, avalia. 

Desafios 

Um dos 80 privilegiados a ingressar na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) em 1957, Braile, já no 3º ano do curso, passou a ter aulas com o prof. Zerbini. “Apaixonei-me de imediato pela Cirurgia Cardiovascular”, diz. Ele relata que o famoso cirurgião o acolheu, passando a lhe dar oportunidades para crescer na especialidade que, diz, estava sendo “inventada” no Brasil. 

“O ambiente era desafiante em uma equipe de grandes cirurgiões e pesquisadores. Na época, com o apoio de um professor e grande amigo, Antonio Geraldo de Freitas Netto, desenvolvemos um ‘Banco de Artérias’ retiradas de cadáveres e conservadas em álcool, um feito para aqueles primórdios”, conta.  

Entre seus mestres figurava Adib Jatene. “Acompanhei-o não só nas cirurgias geniais que desenvolveu, mas também em sua capacidade criativa na área de equipamentos em uma primitiva oficina no porão do Hospital das Clínicas de São Paulo(HC), que ostentava o pretensioso título de Oficina do Coração Artificial”, recorda. 

Para Braile, essa experiência foi, sem dúvida, responsável pela criação e desenvolvimento da sua Braile Biomédica, com sede em São José do Rio Preto (SP), única empresa brasileira que produz equipamentos e insumos para Cirurgia Cardiovascular e neoplasias. “A cirurgia Cardiovascular, como todas as especialidades, vem passando por transformações para tornar-se menos invasiva e cada vez mais fisiológica”, afirma. 

Ao longo de sua carreira, Braile realizou cerca de 25 mil operações. “O cirurgião tem que ter consciência de sua capacidade e da equipe que o cerca; e saber que durante horas o paciente dependerá da performance desse time, dedicando-se de corpo e alma a esta missão de curar quando possível, adotar medidas paliativas, quando não for possível, curar e sedar a dor, sempre. Sedare dolorem opus divinum est (Aliviar a dor é obra divina)”, orienta, citando Hipócrates. 

Visionário 

Braile foi um dos primeiros a viver (já como estudante) a especialidade – o que o levou a conhecer os principais centros mundiais dedicados à Cirurgia Cardiovascular – e, ainda hoje, aos 78 anos, o mantém interessado e atuante como professor da pós-graduação da Unifesp. 

Entre os destaques de sua carreira acadêmica, Braile figura como um dos cinco médicos fundadores da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp), da qual é professor emérito livre-docente e pró-reitor da pós-graduação. Implantou ainda o Serviço de Cirurgia Cardiovascular na Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, da qual é professor sênior. Atua também como editor-chefe do BrazilianJournal of Cardiovascular Surgery (BJCVS). 

E os desafios em sua bem-sucedida carreira médica e acadêmica não param por aí. Braile quer implantar na indústria um mestrado profissionalizante, “um sonho antigo em vias de viabilização, para continuar ensinando Biomedicina às futuras gerações e, quem sabe, convencer as autoridades a deixar-nos criar um doutorado nesta área tão carente no Brasil”, comenta.

Família de médicos   

Filho de Lino Braile, que imigrou na década de 30 para o Brasil, ele conta que, ao optar pela Medicina, espelhou-se no exemplo paterno: “Meu pai foi um médico de família, com forte componente social. Em sua placa de consultório estava escrito: dr. Lino Braile, médico-operador-parteiro! Era muito popular e reconhecido pelos doentes”, recorda. 

“Quando era pequeno, de calças curtas – relembra Braile – perguntavam-me o que eu queria ser quando crescesse. Eu respondia sem titubear: quero ser médico. Mas médico de “cortar”, como o dr. Montenegro (famoso catedrático de Cirurgia da USP, na época)”. Segundo ele, essa história teve um corolário pois, há alguns anos, recebeu a Medalha Benedito Montenegro, do Colégio Brasileiro de Cirurgiões. “Foi a demonstração de que o desejo se transforma em realidade quando se paga o preço para atingi-lo.” 

Mudou-se com a família, em 1945, para São José do Rio Preto, onde vive com a esposa, Maria Cecília. “Estamos casados há 54 anos e temos duas filhas: Patrícia, advogada pela São Francisco (USP) e presidente da Braile Biomédica; e Valéria, cardiologista formada na Unicamp, com Residência no Incor. Entre os descendentes, a tradição na Medicina continua: dos quatro netos, três estudam Medicina. Segundo ele, estudar sempre foi considerado essencial na família. “Todos nós fizemos mestrado, MBA, doutorado e aperfeiçoamentos constantes”, destaca.  

Fonte: Jornal do Cremesp nº 342 de nov/2016 – (pág.12)