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Meu Irmão Jorge (Michalany), por Douglas Michalany

24.08.2012 | Gerais

Com o seu falecimento ocorrido em 9 de julho último, não perdi apenas meu irmão, mas o companheiro de encontros e conversas culturais, abrindo-se um triste vazio neste encanecido coração. E, cada dia que passa, sinto aumentar a falta daquele homem dotado de tantas qualidades. Inteligente, culto, genioso, polêmico, convicto, pragmático, tempestuoso, intransigente em seus pontos de vista, era realmente uma personalidade invulgar.

Médico, formado em 1942 pela sua tão querida Escola Paulista de Medicina, tornou-se um dos mais respeitados anátomopatologistas não só de São Paulo, no Brasil e conhecido como tal nos Estados Unidos, Canadá (estágio com Pierre Masson), México e Argentina. Poliglota, além do português, com rico vocabulário, falava fluentemente o inglês, francês, espanhol, italiano (mais o dialeto napolitano) e latim, língua hoje esquecida, mas de grande importância ainda em nossos dias. Foi membro atuante, por muitos anos, da Organização Mundial da Saúde, acadêmico, professor titular da Escola Paulista de Medicina até entrar na compulsória. Dizia, com acerto, que a Inglaterra perdeu seu Império, mas impôs o Império da língua inglesa, hoje universal, como fora o latim em tempos idos.

Ademais, suas outras qualidades foram inúmeras: dotado de rico conhecimento humanístico, discorria com naturalidade sobre Alexandre, César, Napoleão, Churchill, Rommel, Patton, De Gaulle e outros grandes vultos. Acompanhava dia a dia os acontecimentos mundiais, enriquecendo cada vez mais seus conhecimentos sobre o Império Romano, a herança da Grécia Antiga, a tríade filosófica Sócrates, Platão e Aristóteles, os povos inglês e alemão, a I Guerra Mundial, a II Guerra Mundial, a resistência soviética ante os exércitos nazistas, etc. E, interessante, gostava de box, admirando as figuras de Jack Dempsey, Joe Louis, Cassius Clay, o invicto ítalo –americano Rock Marciano e Eder Jofre.

Abrangente na sensibilidade musical, dotado de excelente voz de tenor, mostrava-se profundo conhecedor de quase todas as óperas, dando, porém, sua preferência ao Rigoletto, do genial Verdi. Considerava Enrico Caruso, o maior tenor de todos os tempos, sem esquecer logo em seguida do saudoso Pavarotti, a quém ouviu inúmeras vezes no Metropolitan House. Sua coleção em CDs de óperas constitui extraordinário acervo, que merecidamente deve ser preservado por seus filhos Omar e Nílceo. E na música popular, as canções napolitanas enchiam seu coração de alegria, pois sempre, nas horas de repouso, as cantarolava. Apreciava a arte cinematográfica, sendo seus astros prediletos Charles Chaplin e Charles Laughton (Testemunha de acusação).

Como escritor, mostrou-se excelente cronista, através dos cinco volumes de sua lavra “Fatos Pitorescos na Vida de um Médico Paulistano”, com narrações engraçadas, memórias de sua época, experiências vividas, representando riquíssimo relicário dos outrora tempos de São Paulo. Incansável no labor, escreveu diversas obras e dezenas de artigos sobre Medicina e, já no apagar de sua profícua existência ainda lançou na Associação Paulista de Medicina seu último livro “Olho Clínico x Erro Médico”; homenageando, como sempre o fazia, nosso dileto pai Nagib Faris Michalany, competente profissional que marcou época em São Paulo, entre 1912 e 1946, como médico, operador, parteiro. Imitava no falar com perfeição, os sotaques dos sírios, libaneses, judeus, portugueses e alemães.

Não bastante, tendo vultoso e riquíssimo patrimônio nas áreas médicas e humanísticas, doou e fundou o “Museu de História da Medicina”, na Associação Paulista de Medicina, com visitação pública e enriquecido com outras doações, até minha, dispondo todo o material que eu tinha da Revolução de 9 de julho de 1932. Foi curador do mesmo até o último dia de sua nobre existência. Politicamente era monarquista e grande admirador do Imperador Dom Pedro II.

Paulista convicto e ardoroso, defensor intransigente dos fastos e feitos da gloriosa Terra Bandeirante, sempre defendeu com exaltação e orgulho a grandeza de nossa gente, estando presente como cabo-enfermeiro na épica Revolução Constitucionalista de 9 de julho de 1932, tornando-se o comandante, como manda a tradição, chefe das Forças Constitucionalistas no período 2010-2011, desfilando orgulhosamente nessa data comemorativa.

Fazia questão (já o dizia) ao ser enterrado, levando em seu peito os distintivos e comendas recebidas por seus feitos em pról de São Paulo de Piratininga, que sempre ostentou envaidecidamente em jornadas, solenidades, palestras, conferências durante sua gloriosa e imortal existência. E, sendo um predestinado, veio a falecer na sua data querida, justamente dia 9 de Julho!

Do seu sempre irmão
Douglas Michalany