Durval Sarmento da Rosa Borges
Durval Sarmento da Rosa Borges nasceu no Recife, em 18 de agosto de 1912, e faleceu em São Paulo, em 10 de julho de 1999. Sempre usou, social e profissionalmente, o nome Durval Rosa Borges, e não seu nome completo. As inevitáveis confusões com seu filho, Durval Rosa Borges, também médico, para ele eram diversão e para o filho motivo de orgulho.
Aos 16 anos mudou-se para o Rio de Janeiro, onde se formou médico em 1933, pela Faculdade Nacional de Medicina da Universidade do Brasil (Praia Vermelha). Mas veio para São Paulo onde, em março de 1936, inaugurou seu laboratório de análises. Assim relatou sua aproximação, por etapas, com a cidade de São Paulo:
Chamava-se Pensão Bandeirante e nela, no ano de 1931, viriam pernoitar em quatro camas paralelas, quatro estudantes pernambucanos do Rio de Janeiro, se iniciando em São Paulo. Situava-se o importante estabelecimento hoteleiro numa Praça da Sé que não mais existe.
O segundo contato foi no dia 1º de julho de 1932, começo de quinzena de férias e colhida a meio caminho pelo movimento cívico de São Paulo; nele ingressei no Serviço Público, deixando a família sem notícias durante três meses. Retornei no Trem Sanitário, acompanhando os doentes e feridos que se destinavam aos hospitais da capital, então pacificada.
O “contato imediato” e final “de 3o grau” se daria simbolicamente no dia 31 de dezembro de 1935 quando aqui desembarquei de trem, para começar Novo Ano e a carreira de médico. Na realidade iniciei uma nova vida.
A afinidade com a terra e com a gente escolhidas foi completa, pois aqui encontrara a mesma formação familiar do Nordeste, acrescida de elementos novos de outras culturas e de outras épocas. Sentia-me, entretanto no Brasil e não atemorizava em pisar chão diferente, apesar de trazer comigo apenas o nome e nenhum outro recurso senão a vontade de trabalhar. E em São Paulo estes dois elementos serão sempre suficientes para começar.
No início ele trabalhava só no laboratório: recebia o paciente, preenchia a ficha, colhia o material necessário, realizava os exames, datilografava os resultados e os entregava ao paciente. A sorologia foi a área de seu particular interesse, tendo estagiado em 1953, com bolsa da Organização Mundial de Saúde, com pesquisadores norteamericanos dedicados ao controle de moléstias venéreas: R. Kahn (em Ann Arbor), S. Olanski (no VDRL na Georgia) e E. Maltaner (em Albany).
Na década de 1940 publicou 3 livros: Estudos sobre a Sífilis (Livraria Ateneu, 1941), Socialização da Medicina (Editora Civilização Brasileira, 1943) e Seguro Social no Brasil (Livraria José Olympio Editora, 1948). No período de 1954 a 1963 foi assistente da cadeira de microbiologia e imunologia aplicadas da Faculdade de Higiene e Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). Representou esta faculdade em Genebra por ocasião da Conferência Internacional de Poliomielite (1957). Publicou, em 1959, “Laboratório de Análises Clínicas em São Paulo. Pequena Contribuição à sua História” (Suplemento 1 do volume 55 da Revista Paulista de Medicina), trabalho laureado com o Prêmio “José Almeida Camargo”, conferido pela Associação Paulista de Medicina.
Sua vida associativa foi intensa e, dado seu temperamento, por vezes conflituosa. Na Associação Paulista de Medicina (APM) foi presidente do Departamento de Previdência no período 1946-1952, quando foi criado o selo médico; e presidente do Departamento de Cultura Geral de 1960 a 1963. Foi representante da APM na criação da Associação Médica Brasileira (Belo Horizonte, 1951). Presidiu a Academia de Medicina de São Paulo no biênio 1966-1967 e o Rotary Club de São Paulo no período de seu cinquentenário (1973-1974). Piloto amador que era, no Rotary, coordenou a edição do livro O Vôo da Paz, e entregou um exemplar pessoalmente ao Papa João Paulo II, em Roma.
Viajante, foi o primeiro brasileiro a ir à Antártida, onde desfraldou a bandeira do Brasil. Desta aventura resultou o livro Um Brasileiro na Antártida (edição da Sociedade Geográfica Brasileira, 1959). Caçador, reuniu lembranças no livro Amanhã Pode Chover (Martins Fontes Editora, 1978). Sonhador, escreveu Nove Histórias Fantásticas e uma Verdadeira (Editora Klaxon, 1981). Para o lançamento desse livro escreveu o monólogo “Autobiografia do Enfarte do Otimista”, lido na ocasião por seu amigo Paulo Autran.
Fazendeiro, criou gado em Angatuba, no interior de São Paulo, e, a seu estilo, nas margens do Rio Araguaia. Filho do Capibaribe encantou-se com o Araguaia e escreveu Rio Araguaia – Corpo e Alma (Editora da Universidade de São Paulo, 1987). Esse livro mereceu dos irmãos Villas Bôas o comentário: “O Araguaia é o único rio brasileiro que tem sua história bem contada. Nada escapou do historiador e do geógrafo. O rio foi descrito das nascentes à foz. As vilas, cidades e as gentes foram lembradas. Os índios, donos do rio, não foram esquecidos. O Araguaia – Corpo e Alma do historiador Rosa Borges atingiu plenamente aquilo a que se propôs.” (A marcha para o Oeste, Editora Globo, 1994, pg 611).
Além da clínica privada em seu laboratório atendeu, em diferentes períodos, institutos (como o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários) e hospitais. O envolvimento hospitalar mais significativo foi com a Beneficência Portuguesa de São Paulo, de 1969 a 1983. Ao deixar o Hospital, o laboratório realizava 3.000 exames/dia; empreendimento só possível graças a seu precoce reconhecimento do papel da automação no laboratório de análises. Dois aspectos devem ser destacados nessa atuação hospitalar. O primeiro aspecto é que a introdução da automação na rotina laboratorial foi acompanhada do desenvolvimento de programas próprios de controle de qualidade, divulgados em congressos e em revistas especializadas. O segundo aspecto é que àquela época, os hospitais não tinham laboratórios, por incrível que isso possa hoje parecer. Existiam nos hospitais sistemas de coleta de material, material este que era levado a laboratórios externos, onde os exames eram realizados. Com o desenvolvimento da cirurgia cardíaca, essa distância entre laboratório e hospital passou a ser fator limitante. A implantação de um laboratório completo e autossuficiente dentro do hospital colaborou para o reconhecimento da medicina laboratorial como especialidade; a interação entre o corpo médico do laboratório e o corpo clínico do hospital passou a ser de 24 horas por dia, 7 dias por semana.
Foi casado desde 1942 com Maria Albertina, filha do otorrinolaringologista José Eugenio de Paula Assis. O casal teve dois filhos (Durval e Alfredo) e seis netos. À esposa dedicou o poema “A Mão de Maria”, em cuja última estrofe se resume:
História pequena que eu contarei começa e termina na mão de Maria pedida, roubada, tomada, nem sei E quem saberia? Só sei que essa história, que é minha e pequena começa e termina na mão de Maria.
NOTAS:
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Biografia e foto foram fornecidas pelo autor.