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Biografia

Edmundo Vasconcelos

Edmundo Vasconcelos nasceu em São Paulo, aos 18 de março de 1905. Era filho do negociante português Manuel Pereira de Sousa Vasconcelos e Maria Alice Delarue Palavet Vasconcelos. 

Ingressou, em 1917, no Ginásio de São Bento, formando-se, em 1922, com medalha de ouro de orador da turma. Em 1923, ingressou na Faculdade de Medicina da Universidade do Rio de Janeiro, sendo aprovado com distinção nas matérias constantes do 1º ano do curso. 

Nesse mesmo ano pediu e obteve transferência para a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, onde se diplomou, em 1928. Defendeu tese, nessa ocasião obrigatória, na cadeira de clínica cirúrgica, apresentando um trabalho sobre a Cirurgia dos Divertículos do Esôfago, em que estudou a questão clínica e experimental, tendo proposto uma nova técnica operatória baseada em verificações laboratoriais com a finalidade de evitar a reincidência. 

Essa tese foi aprovada com “grande distinção”, tendo a comissão examinadora lançado no livro das atas a seguinte declaração: “A comissão examinadora, dado o alto valor desta tese, lamenta não poder dar nota maior da que foi dada, consigna, no entanto, neste termo, o alto mérito e valor que tem o trabalho apresentado”.

Com esse trabalho concorreu ao prêmio de cirurgia instituído pela Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, tendo obtido o prêmio Botelho de 1928. 

Desde o seu ingresso na faculdade nunca mais se apartou da “alma mater”, junto à qual permaneceu por toda a sua vida docente. Assim, logo após a formatura, ingressou no laboratório de anatomia patológica, na qualidade de assistente-adjunto, tendo tido oportunidade de publicar alguns trabalhos de anatomia patológica. 

Ainda como estudante, em abril de 1925, ingressou para a clínica cirúrgica do professor Benedito Montenegro, de cujo serviço clínico particular foi o “chefe de clínica” durante dez anos, tendo-o deixado, em maio de 1934, por motivo de concurso. Sendo discípulo do professor Benedito Montenegro, trabalhou na equipe desse renomado mestre no Sanatório Santa Catarina, ao lado de Piragibe Nogueira da Silva, João de Lorenzo e muitos outros renomados médicos. 

Edmundo Vasconcelos foi o ilustre cirurgião que por mais de quatro décadas exerceu notável influência no ensino, pesquisa e desenvolvimento da cirurgia em nosso país, pontificando em sua disciplina na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 

Professor catedrático muito jovem, iniciou uma carreira médica brilhante, sendo dotado de sólida cultura geral, ao lado de uma extraordinária habilidade e inclinação inatas para os misteres da cirurgia, onde foi proeminente e soberbo. 

Em 1931, ingressou como 1º assistente e chefe de laboratório da cadeira de técnica cirúrgica e cirurgia experimental, tendo sido efetivado aos 14 de fevereiro desse ano. 

Em abril desse mesmo ano, por motivo do afastamento do catedrático, assumiu, por designação do professor Sergio Meira, então diretor, o cargo de professor interino, tendo regido a cadeira durante todo o ano letivo.

Voltou a desempenhar novamente as funções de chefe de laboratório até janeiro de 1935, quando, por transferência do catedrático, foi designado pelo diretor para reger interinamente a cadeira, contando com apenas 30 anos. 

Por motivo do início das aulas e estando ainda vaga a referida cadeira, foi designado para exercer pela segunda vez o cargo de professor interino, tendo ministrado o ensino regular da cadeira durante o 1o semestre desse ano letivo, bem como tomado parte nas bancas de exames parciais para as quais foi designado. 

Durante a permanência na escola e com fins de completar a instrução especializada, frequentou os cursos regulares e extraordinários de embriologia do professor Carmo Lordy. Para maior eficiência do departamento criou aí as seções de anatomia cirúrgica e patologia cirúrgica, o que veio enriquecer em muito o material didático e aumentar as possibilidades do ensino, dando-lhe uma orientação mais prática e maior contato com a clínica. 

Organizou, ainda, uma seção privativa de desenho, motivada pela necessidade permanente de grande número de pranchas e esquemas para o ensino que, pela sua própria quantidade, impediam a requisição à seção competente da escola, sem grave dificuldade de sobrecarga. Foram, assim, feitas 450 pranchas e 520 diapositivos que serviram não somente para a cadeira e ensino da técnica como a alguns dos departamentos da faculdade. 

Foram inúmeras as suas realizações e inovações no âmbito da cirurgia. Dentre elas destaca-se a metodização cirúrgica que ele publicou em detalhes, divulgando-a para os diversos serviços universitários do país. A importância dessa metodização era especificar as atribuições e tarefas da equipe cirúrgica, com os tempos técnicos do ato operatório sincronizados, sempre numa sequência perfeita, um trabalho que, ao lado da função artesanal, tinha muito de artístico e harmonioso. Mantinha-se a hierarquia dentro da sala de operações e cada elemento aprendia exatamente suas atribuições, havendo um cuidado escrupuloso para com os atos fundamentais de diurese, hemostasia e síntese, além da exploração endocavitária, trazendo como consequência um menor tempo operatório e anestésico em benefício do paciente. Ao terminar a intervenção exigia-se que a mesa do instrumental cirúrgico devesse apresentar a mesma disposição e arranjo com que a iniciara. 

Sua influência marcante se fazia igualmente através dos chamados “cursos de férias”, quando, anualmente, compareciam cirurgiões de todo o país para atualização e reciclagem. 

Edmundo Vasconcelos participou ativa e ininterruptamente de inúmeros congressos médicos nacionais e internacionais, computando-se mais de 150 em seu extenso curriculum vitae, onde levava sua experiência, notadamente em cirurgia do aparelho digestivo. Pessoalmente, mantinha contato frequente com serviços de cirurgia da América Latina, Estados Unidos e Europa, onde era recebido com honrarias, tendo sido doutor honoris causa de várias universidades. 

No Brasil, além de condecorações e prêmios, foi membro emérito do Colégio Brasileiro de Cirurgiões e do Colégio Internacional de Cirurgiões. Teve seu ingresso como membro titular da insigne Academia Nacional de Medicina, em 2 de dezembro de 1971. 

Pertenceu a diversas associações, entre elas: Academia Paulista de Letras; Academia Nacional de Medicina; Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, hoje, Academia de Medicina de São Paulo; Associação Paulista de Medicina; Sociedade de Biologia de São Paulo; Associação Médica do Instituto Penido Burnier de Campinas (sócio honorário); Sociedade Internacional de Cirurgia; Colégio Americano de Cirurgiões; Associação Argentina de Cirurgia (sócio titular) e Sociedade de Gastroenterologia de Nova York. Conseguiu, assim, estender a sua atividade a numerosas associações de classe, procurando colaborar no seio desses grupos.

Edmundo Vasconcelos ocupou muitos cargos e diversas funções, destacando-se cirurgião do Sanatório Santa Catarina e do Hospital Alemão; cirurgião-chefe dos Sanatórios Populares de Campos do Jordão; do Sanatório Santa Cruz e chefe da clínica particular do professor Benedito Montenegro.

 Autor prolífico, além de inúmeros artigos médicos, publicou livros de medicina, entre os quais: Ulcer of the Stomach and Duodenum (1947), Métodos Modernos de Amputação (1942, em espanhol); Cirurgia do Megaesôfago (1937) e Cirurgia do Câncer do Esôfago

Ambidestro, operava com extrema elegância, principalmente as doenças do aparelho digestivo.

Edmundo Vasconcelos publicou ainda um certo número de lições e artigos esparsos sobre assuntos cirúrgicos com base na técnica ou na experimentação. Assim, apareceram: “Úlcera Duodenal em Criança de Dois Anos” (1929); Carcinoma da Mama no Homem” (1930); “A Esplenectomia na Púrpura Hemorrágica Trombocitopênica – Moléstia de Werlhoff” (1931); “Úlcera Jejunal Pós-operatória” (1934); “Abscessos Subfrênicos” (1934); “Úlceras Pépticas Experimentais” (1934), dentre outros. 

Em suas obras expunha técnicas próprias e inovações como, por exemplo, da correção cirúrgica do divertículo faringoesofágico; suas ideias no polêmico tema dos megas (megaesôfago, megacólon); variações técnicas em gastrectomias parciais; cirurgia das vias biliares; a reintrodução dos métodos de sutura mecânica para anastomose na cirurgia do cólon (década de 50); e a sistematização na conduta cirúrgica de amputação da coxa e do pé, onde apresentou uma variante técnica que leva o seu nome. 

Deve ser ressaltado que foi ele um pioneiro na cirurgia toracopulmonar, instalando, em 1938, o primeiro Centro de Cirurgia Torácica em Campos do Jordão. Nessa especialidade fez igualmente inovações, criando alguns instrumentos cirúrgicos como, por exemplo, o afastador de omoplata e a rugina para desperiostização costal, ainda hoje, em pleno uso. 

Decididamente autoritário ao impor a disciplina e normas em seu serviço de cirurgia, Edmundo Vasconcelos era igualmente exigente no cumprimento das atividades médicas no ambulatório, na enfermaria, e, principalmente, na sala de operações, onde observava o máximo rigor nos detalhes da técnica cirúrgica. A rotina do trabalho imposta era exaustiva e exigia de todos um conhecimento básico de anatomia, fisiologia, clínica e anatomia patológica, além de rígida disciplina e postura médica convenientes. 

Todo esse empenho em criar, inovar e divulgar a cirurgia, dentro das normas e exigências do seu serviço, produziu uma plêiade de ilustres seguidores que desenvolveram e deram seguimento à sua “Escola” em várias universidades e serviços médicos, públicos e particulares. 

Dentre tantos mestres da cirurgia brasileira que formou encontram-se: Ruy Escorel Ferreira Santos, Álvaro Dino de Almeida, José Finocchiaro, Silvio Alves de Barros, Silvano Raia, William Saad Hossne, dentre outros. 

Edmundo Vasconcelos era versátil nas lides intelectuais, possuindo apreciável cultura humanística. Em prosa e poesia abordou vários temas, incluindo dentre tantas publicações suas: “Oração aos Médicos”, “Psicologia da Aprendizagem Médica” e “Sessenta Anos de Medicina na Universidade de São Paulo”, onde salientou o papel dessa instituição no ensino do país. Seu talento como conferencista e prosador valeu-lhe a indicação e ingresso na Academia Paulista de Letras, ocupando a cadeira no 10. 

Pelo que realizou como cirurgião emérito e professor de medicina, influenciando de maneira marcante a tantos, merece, Edmundo Vasconcelos, o título augusto que desde tempos imemoriais costumava-se distinguir uma personalidade como a dele: “Chirurgus Peritissimus et Doctor Clarissimus“. Edmundo Vasconcelos faleceu em 11 de novembro de 1992, aos 87 anos. 

Seu nome é honrado com um importante hospital da capital paulista, situado na rua Borges Lagoa, na Vila Clementino. 

NOTAS: 

Esta biografia é uma autoria do Acad. Helio Begliomini, Titular e Emérito da cadeira nº 21 da Academia de Medicina de São Paulo sob o patrono de Benedicto Augusto de Freitas Montenegro.

Na pesquisa realizada foi encontrado seu sobrenome “Vasconcelos” também grafado com dois “l”, Vasconcellos.