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Biografia

Nildo Alves Batista

Nasci em 4 de setembro de 1947, na cidade de Jacuí́, no interior de Minas Gerais, e aos três meses de idade, mudei-me para Passos, no sudoeste do Estado. Meu pai (Sebastião, falecido em 1995) e minha mãe (Donana, falecida em 2014), sempre viveram de pequenos negócios e tinham como meta maior a educação dos filhos – segundo eles, o legado que, com certeza, poderiam deixar. Sou o caçula de quatro (duas irmãs, Almerinda e Janete, professoras, e um irmão, Nilson, falecido em 1983). Cresci nesse interior, onde cursei os então, Primário, Ginasial e Científico em escolas públicas, convivendo com grande afunilamento do número de colegas de classe de um ciclo para o outro. 

A opção pela carreira médica, como de costume, não foi fruto de um processo de plena conscientização e conhecimento fundamentado. Tampouco resultou da influência familiar, algo muito comum nessa profissão. Fui o primeiro, na família, a buscar o curso superior e era mesmo um desejo que partia de mim. Prestei vestibular para duas escolas públicas no Estado. Fiquei numa lista de excedentes na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte, e fui aprovado na Faculdade Federal de Medicina do Triangulo Mineiro (atual UFTM), em Uberaba. Apesar de ser convocado pela UFMG no ano seguinte, preferi continuar no interior. 

Vivi intensamente a graduação. A partir do terceiro ano do curso, optei pela moradia ao lado do hospital-escola, o que me possibilitava participar ativamente do seu cotidiano. Para a realização do internato optei pelo Hospital do Servidor Público Estadual, em São Paulo, iniciando meu contato definitivo com esta cidade, onde me fixei e desenvolvi toda a trajetória pessoal, profissional e acadêmica. 

Na residência médica optei pela pediatria. A partir daí, iniciei uma trajetória como pediatra geral e neonatologista em dois hospitais: no próprio Hospital do Servidor (Serviço de Emergência) e na Maternidade-Escola Vila Nova Cachoeirinha. Logo em seguida, passei também a trabalhar na Clínica Infantil do Ipiranga. Minha atividade principal nesses hospitais era a assistência, embora desenvolvesse também atividades de ensino. Com seis anos de formado, passei também a trabalhar em consultório próprio. 

Todo esse investimento na carreira médica foi acompanhado de conquistas pessoais: iniciei a construção de minha família, me casei e nasceram minhas filhas: Mariana e Ana Luiza. 

No final da década de 1970 e início da de 1980 cursei a pós-graduação: mestrado e doutorado na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Passei também a trabalhar na Faculdade de Medicina de Santo Amaro, onde exerci os cargos de professor titular, diretor clínico do hospital-escola e diretor da Faculdade. Fui, progressivamente, me interessando pelas questões relativas à educação médica, mas continuei desempenhando, acima de tudo, as atividades como médico pediatra. Foi uma década de muito empenho no consultório, espaço no qual atendia, também, uma grande quantidade de filhos de outros médicos. 

No início da década de 1990 trabalhei em regime de dedicação exclusiva no Núcleo de Tecnologia Educacional (Nutes) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde permaneci até 1994. A opção definitiva pela docência universitária, com a interrupção das atividades no consultório, significou um desafio importante em minha trajetória. Em 1994, passei a atuar na Escola Paulista de Medicina, a qual nesse mesmo ano foi transformada em Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Nessa Escola prestei concurso de livredocência em educação médica em 1997 e, em 2008, passei a professor titular na área de ensino em ciências da saúde. Em 2014, com mudança de meu regime de trabalho na Unifesp, voltei a ser médico e professor. 

Na Unifesp, destaco minha participação na criação do Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde (Cedess), em 1996. Em 2003, implantei e fui o primeiro coordenador do mestrado de ensino em ciências da saúde e, em 2004, coordenei a implantação do Campus Baixada Santista da Unifesp, assumindo a elaboração do Projeto Pedagógico, no qual a educação interprofessional é o fundamento da formação em saúde. 

Na Unifesp também atuei como pró-reitor adjunto de graduação e de planejamento e como coordenador da Secretaria Especial de Planejamento. Nessas experiências tive a oportunidade de compreender a universidade em sua totalidade, com suas demandas e possibilidades para uma educação superior democrática. 

Essa tríade de criação, coordenação e direção traduz o quanto o trabalho coletivo, a parceria, a troca, o compromisso com uma educação superior em saúde, especialmente com a educação médica, coadunada com as demandas sociais, fizeram e fazem diferença em minha trajetória acadêmica. Criar junto com outros colegas; coordenar e dirigir na perspectiva colegiada; educar com e para todos e todas. 

No campo das publicações, o traço coletivo e em coautoria emergem como estruturantes: desde os primeiros artigos no campo da pediatria até os livros e obras organizadas em educação médica, sempre estive acompanhado de professores que me ensinaram com seus exemplos; de colegas que partilham o amor pela pediatria e pelo ensino na saúde; de estudantes que acreditam na produção científica rigorosa. 

Nesse escopo, realço a oportunidade de participação no Proyecto Tuning – America Latina: Innovación Educativa y Social, onde pude desenvolver discussões valiosas sobre o ensino médico na America Latina. Todas estas reflexões foram ampliando as inserções que construo desde 1990, na educação médica, encontrando um momento especial na minha atual condição de presidente da Associação Brasileira de Educação Médica (biênio 2019- 2020). 

A década de 1990 significou também novos encontros. Saliento o encontro com Sylvia, com quem me casei em 1999 e passei a partilhar, além da vida afetiva e do cotidiano pessoal, uma fecunda parceria científica, bastante evidente em toda minha trajetória docente e de pesquisa. Tivemos, há 20 anos, Clara, atualmente graduanda de direito. 

No processo de retomadas que a elaboração de uma biografia implica, olhar atualmente minhas três filhas me remete a três momentos singulares: com Mariana, médica dermatologista, mãe de Alice e Tomás, mestre e doutora, revisito a construção do “ser médico” e do “ser avô”; com Ana Luiza, artista plástica, mestre e doutora, a trajetória acadêmica; e com Clara, em seus primeiros anos de graduação, o encantamento com as inovações no campo da educação superior. 

Neste momento em que concluo a elaboração desta biografia, marco de minha entrada na Academia de Medicina de São Paulo, percebo-me lançado a novos desafios. E assim, encontro as palavras de Guimarães Rosa: “eu quase que nada sei. Mas desconfio de muita coisa. Sigo vivendo e aprendendo, junto com tantas pessoas”. Pensar no meu futuro permite expressar um desejo: colaborar com a discussão sobre a educação médica no âmbito da nossa Academia. 

NOTAS: 

A biografia foi fornecida pelo autor e a foto foi obtida por ocasião de sua posse, que ocorreu em 23 de outubro de 2019, no anfiteatro nobre da Associação Paulista de Medicina

Pequenas inserções e adaptações do texto ao perfil desta secção, assim como as notas de rodapé foram feitas pelo Acad. Helio Begliomini, Titular e Emérito da cadeira nº 21 da Academia de Medicina de São Paulo sob o patrono de Benedicto Augusto de Freitas Montenegro.