Vital Brazil Mineiro da Campanha
Vital Brazil Mineiro da Campanha nasceu em 28 de abril de 1865, em Campanha. Eis a explicação do seu nome: Vital era o nome do santo do dia; Brazil, em homenagem ao país que, na época, se escrevia com “z”; Mineiro, em homenagem ao seu estado e, Campanha, referente à sua cidade natal, situada ao sul de Minas Gerais.
Sua mãe, Mariana Carolina Pereira de Magalhães era prima de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes. Seu pai, José Manoel dos Santos Pereira Júnior resolveu colocar em cada um dos seus oito filhos um nome diferente, a fim de não dar continuidade ao nome da sua família, com a qual estava brigado.
Vital Brazil passou a infância nas cidades mineiras de Campanha, Itajubá e Caldas, trabalhando desde os 9 anos para ajudar o sustento da casa. Com 15 anos veio para São Paulo com a família, onde passou o resto da sua juventude entre o trabalho e os estudos preparatórios. Seu objetivo era cursar medicina e, na época, só existiam duas faculdades: uma na cidade de Salvador e outra na cidade do Rio de Janeiro.
Assim, com 21 anos ele foi para o Rio de Janeiro, onde trabalhou como escrevente de polícia e professor, para se sustentar e custear seus estudos na faculdade. Durante o curso fez concurso e passou a ser o colaborador e preparador das aulas de fisiologia.
Graduou-se em 1891, com 26 anos, defendendo a tese de doutoramento intitulada Funções do Baço.
Retornou a São Paulo e clinicou em várias cidades do interior, entre as quais Rio Claro, Jaú, Leme e Pirassununga, combatendo epidemias.
Casou-se pela primeira vez em 1892, logo após a sua formatura, com Maria da Conceição Philipina de Magalhães, sua prima em segundo grau, com quem teve 12 filhos, dos quais nove chegaram à idade adulta.
Trabalhou como médico na Força Pública e no Serviço Sanitário em São Paulo e Botucatu. Durante as epidemias de febre amarela, varíola e cólera, chefiou a comissão sanitária em Cachoeira, no vale do Paraíba, e combateu a peste bubônica na cidade de Santos, contraindo a doença durante o trabalho. Foi em Botucatu que ele, impressionado com os acidentes causados por serpentes venenosas, resolveu estudar o assunto, abandonando a clínica e indo trabalhar no Instituto Bacteriológico de São Paulo.
A convite do governo estadual, Vital Brazil ingressou em 1897 no Instituto Bacteriológico do Estado de São Paulo, dirigido pelo sábio cientista Adolpho Lutz. Foi aí que tiveram início suas pesquisas.
Com o apoio do Adolpho Lutz e com o conhecimento dos estudos de Calmette sobre soros antiofídicos, fez os primeiros experimentos com os venenos das serpentes.
Nessa época ocorriam quase 3.000 acidentes por ano só no estado de São Paulo. Vital Brazil criou uma das primeiras escolas do país que alfabetizava crianças de dia e adultos à noite; desenvolveu materiais de informação sobre como se proteger das cobras e outros animais peçonhentos para as pessoas do campo; inventou uma caixa de madeira barata e segura para que os fazendeiros pudessem capturar as cobras; e firmou convênios com as estradas de ferro para transportá-las, pois eram essenciais à fabricação do soro.
Vital Brazil trabalhou também junto com Oswaldo Cruz e Emílio Ribas no combate à peste bubônica, ao tifo, à varíola, e à febre amarela.
Seu nome ficou conhecido pela sua dedicação à saúde pública; pelo seu entusiasmo e pelos estudos experimentais que representavam na época o começo das pesquisas no Brasil. Por causa disso, foi chamado pelo Governo do Estado de São Paulo para ajudar a criar um Instituto Soroterápico, que produzisse soros e vacinas que combatessem as epidemias que vinham assolando a população.
Foi então comprada uma fazenda chamada Butantan pelo governo de Rodrigues Alves, que situava-se às margens do Rio Pinheiros. Aí Vital Brazil começou em 1901, em instalações provisórias num estábulo adaptado, as imunizações dos cavalos para fazer a vacina contra a peste, e continuou com as pesquisas sobre os venenos das serpentes. Nesse mesmo ano publicou seu primeiro trabalho sobre o envenenamento ofídico e demonstrou que o soro para o tratamento dos acidentes tinha que ser específico. Também produziu as primeiras ampolas de soro contra o veneno de jararaca e cascavel.
Foram aí desenvolvidos trabalhos, sem tréguas, num ambiente desprovido de recursos. Os primeiros tubos de soro antipestoso começaram a ser entregues após quatro meses de trabalho.
Em 1903 surgiu o soro antiofídico (Piroplasma vitalli), parasita do sangue dos cães.
Após esse tempo outros soros foram desenvolvidos no Instituto Serumtherápico. As vacinas produzidas também serviam ao combate do tifo, varíola, tétano, psitacose, disenteria bacilar e BCG. As sulfas e as penicilinas viriam mais tarde. As picadas de aranhas venenosas, escorpião e lacraias deram origem a novos soros.
Em 1904, como prêmio de sua descoberta sobre a especificidade do soro antiofídico, foi para a França onde frequentou o Instituto Pasteur. Dele, o eminente cientista
Albert Calmette, assim se referiu: “A obra científica de Vital Brazil é absolutamente de primeira ordem. Os seus trabalhos sobre venenos e sobre as soroterapias antivenenosas salvaram milhares de existências. Sinto-me particularmente feliz ao associar-me à homenagem que vos propondes lhe prestar, e o Instituto Pasteur de Paris, unanimemente, partilha os sentimentos de alta estima e admiração que me ligam ao nosso ilustre colega e amigo”.
Ficou viúvo em 1913 e casou-se novamente em 1920 com Dinah Carneiro Vianna, com quem teve mais nove filhos. Dezoito filhos chegaram à idade adulta, nove do primeiro e nove do segundo casamento. Seis homens e três mulheres de cada um deles.
Vital Brazil ficou consagrado em congresso científico nos Estados Unidos da América em 1915, e seu trabalho logo despertou o interesse da Europa, onde se encontrava a vanguarda da pesquisa médica da época, e lhe valeu o reconhecimento mundial.
O Instituto Butantan representa um marco na ciência experimental brasileira.
Desenvolvendo significativo número de pesquisas de elevado teor cientifico; educando as populações rurais na adoção do tratamento e na prevenção de acidentes ofídicos; e criando aquela que foi, possivelmente, a primeira escola de alfabetização de adultos, esse instituto desempenhou importante papel social na época e tornou-se conhecido e famoso no mundo todo.
O Instituto Serumtherápico passou a se chamar Instituto Butantan e, junto com Vital Brazil, seu diretor, ganhou prestígio e importância graças ao seu trabalho pioneiro e de seus colaboradores.
Em 1915, durante a estadia de Vital Brazil em Nova York, o soro brasileiro salvou da morte um empregado do Jardim Zoológico do Bronx Park, após ter sido picado por uma Crotalus atrox e não ter tido sucesso com outros tratamentos já empregados.
Vital Brazil tornou-se membro honorário da Academia Nacional de Medicina em 1917. Em 1919, ele foi convidado pelo governo do estado do Rio de Janeiro a criar um centro de pesquisas biológicas em Niterói, sendo aí fundado o Instituto Vital Brazil.
Vital Brazil Mineiro da Campanha tinha por lema “Veritas Super Omnia” (“A Verdade Acima de Tudo”). Era espiritualista e conhecia profundamente a Bíblia. Faleceu em 8 de maio de 1950, no Rio de Janeiro, aos 85 anos, ainda na direção do Instituto Vital Brazil.
Seu nome é honrado como patrono da cadeira nº 62 da augusta Academia de Medicina de São Paulo; dá nome a escolas em São Paulo (bairro Bela Vista) e em Belo Horizonte (bairro Padre Eustáquio); o bairro onde situa-se a sede do Instituto Vital Brazil em Niterói chama-se Vital Brazil, assim como uma importante avenida nessa cidade; em São Paulo há uma avenida chamada Vital Brazil, uma das mais importantes da zona oeste da cidade.
Um livro biográfico sobre Vital Brazil faz parte da série “Nomes do Brasil”, que homenageia algumas das principais personalidades do nosso país, como Carmem Miranda e a Princesa Isabel.
Vital Brazil dá nome à rodovia BR 267 que liga Juiz de Fora a Poços de Caldas, ambas em Minas Gerais. Com cerca de 200 Km, a estrada foi batizada em 1965 (centenário de nascimento do cientista) pelo presidente da República, Castelo Branco. Nesse mesmo ano foi impresso pelos Correios um selo em sua homenagem (Figura 1).
A Casa da Moeda do Brasil expediu uma cédula no valor de Cr$ 10.000,00 (dez mil cruzeiros) cujo anverso era a efígie do cientista Vital Brazil, tendo à esquerda, gravura que representa uma cena clássica da extração do veneno, tarefa básica para a produção de soros.
No reverso, há um painel calcográfico mostrando um antigo serpentário, com destaque para a cena de cobra muçurana devorando uma jararaca.
Na cidade de Campanha (MG), a casa onde o cientista nasceu abriga hoje o Museu Vital Brazil. Foi construída em 1830, com arquitetura do período colonial, telhas feitas à mão por escravos e paredes de pau-a-pique. Ali estão expostos aos visitantes pesquisas, documentos, certidões, fotografias e livros. A inauguração ocorreu em 1988 e o local funciona como centro divulgador dos trabalhos e da vida do cientista.
Pelo Projeto de Lei 1604/2003 do Congresso Nacional, o nome do cientista Vital Brazil entrou para o Livro dos Heróis da Pátria, que se encontra no Panteão da Liberdade e da Democracia, no subsolo da Praça dos Três Poderes, em Brasília.
NOTAS:
Esta biografia é uma autoria do Acad. Helio Begliomini, Titular e Emérito da cadeira nº 21 da Academia de Medicina de São Paulo sob o patrono de Benedicto Augusto de Freitas Montenegro.