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APAE — 50 anos, por Acad. Nelson Guimarães Proença

09.08.2011 | Tertúlias

Em abril deste ano de 2011, a Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais — APAE — de
São Paulo completou 50 anos de existência. A data foi recordada com a realização de eventos
específicos que, com justiça, ganharam destaque na mídia. Homenagem merecida.
Recordou-se muito do que se passou naquela distante década de 1970. Nem tudo, porém, foi
relembrado com a devida precisão. Acho interessante recordar, da maneira mais fidedigna possível,
fatos ocorridos e que não foram ainda narrados. Farei isso agora, cuidando para que não acabem
fazendo parte de um passado já esquecido.
Por uma circunstância especial, fui espectador privilegiado, tendo acompanhado e conhecido
episódios que marcaram o nascimento da APAE. A razão: meu irmão Helio e minha cunhada Iva
foram seus protagonistas. Conto, então, alguns episódios iniciais como os tenho na memória.
A princípio, por que a data de 11 de abril? Porque foi nesse dia, no ano de 1961, que um pequeno
grupo, formado por cinco casais, fez um comunicado à imprensa noticiando a criação da nova
entidade associativa. Esses casais tinham um elo que os aproximava fortemente: filhos com
“deficiência mental”, como se dizia na época. Recordo dos nomes de três desses casais: Ruth e
Gilberto da Silva Telles, Bella e Acácio Werneck e Iva e Helio Guimarães Proença.
Não havia liderança única, todos se igualavam na hierarquia. A iniciativa repercutiu
favoravelmente perante o professor Enzo Azzi, Diretor da PUC, que cedeu uma sala para que
reuniões pudessem ser realizadas. Ali foram feitos os primeiros encontros, os quais, depois,
continuaram ocorrendo na Associação Comercial.
Os casais estavam motivados para a empreitada. Não aceitavam que seus filhos, excepcionais,
fossem privados de ter uma vida normal. Na época, essas crianças eram até mesmo escondidas e,
embora protegidas, não recebiam nenhuma atenção educacional, nenhum aprendizado. Eram
crianças para quem a vida apenas passava. O grupo de casais entendia que era necessário dar a elas
um apoio especial.
A comunicação à imprensa se fez por meio de uma nota informativa esclarecendo aquilo que se
pretendia ao criar uma associação para dar um apoio diferenciado aos “excepcionais”. Criou-se,
então, o maior equívoco, que particularmente ocorreu por parte do prestigioso jornal “O Estado de
S. Paulo”. Ao mesmo tempo em que divulgou a nota informativa, o jornal publicou sua expressa
discordância com a iniciativa. A confusão resultou do emprego, pela primeira vez entre nós, da
palavra “excepcional” para designar a situação dos menos dotados. O jornal havia entendido que se
tratavam de crianças superdotadas, que precisavam de estímulo para aproveitar seus dotes
“excepcionais”, seus “superdotes”.
Recordo-me perfeitamente do enorme constrangimento causado pelo equívoco. Meu irmão
Helio escreveu belíssimo texto, explicitando os fatos e o sentido em que estava sendo aplicada a
palavra “excepcional”. Esclareceu que ela se aplica não só aos que estão acima da média mas
também aos que estão abaixo. Nessa carta, foi pedido o apoio do jornal e da opinião pública. O que
se seguiu foi um fato inusitado, talvez único na história do “Estadão”. Ao publicar o texto enviado
por Helio, este publicou também, com destaque editorial, a retificação de sua opinião anterior. Mais
ainda: o jornal se pôs à disposição da APAE, tendo efetivamente se incorporado, desde essa época
até hoje, na divulgação de suas atividades.
Os primeiros anos da APAE foram muito difíceis. Foi somente em 1968 que as dificuldades
começaram a ser superadas, com a chegada à instituição do casal Jô e Antonio Clemente. Seu
dinamismo mudou o curso dos acontecimentos. Mas essa já é uma outra história, que deixo para ser
contada por outros, mais credenciados do que eu.